Um Órgão Fora de Moda

Desde o início deste blog que aqui digo que há coisas que me intrigam sobremaneira. Coisas que não intrigam praticamente mais ninguém, dada a superior esperteza dos outros e superior parvoíce minha. Ainda assim, gosto de me sentir intrigado. Porque a intriga (exceptuando na versão “faca e alguidar” das novelas) até é uma coisa catita. Vá por mim, InSensato Leitor.

Ora… dizia eu… Fui alertado para um facto que me tem intrigado. Hoje em dia, já pouco se fala na vesícula.

Verdade. Já pouco se ouve dizer «As crises de vesícula são danadas, levadas da breca!» ou «Ando c’umas dores de vesícula que não posso!» ou ainda «Arre que a vesícula não me deixa em paz!». Aliás, pouco… ou nada, até porque se não tivessem falado da vesícula para me alertar do facto de que já não se fala de vesícula, não estaria agora aqui a falar precisamente dela.

Coloco-lhe a questão que me foi posta a mim: A vesícula terá caído em desuso?

A questão pode parecer de simples resposta “Sim” ou “Não”… mas não é.

Nunca poderemos responder afirmativamente, porque a vesícula ainda se usa. Não desapareceu e, ao que consta (informei-me junto de médicos), continua a desempenhar a sua função no corpo humano. Logo a resposta parece, imediatamente, redundar num “Não” inequívoco, o que também não estará correcto. Se a vesícula (órgão) não caiu em desuso, já a referência a ele e aos problemas que cria há muito deixou de fazer parte do quotidiano. Caiu, esta sim, em desuso.

Eu defendo que passou de moda, que já não está “in”, que já não faz grande mossa falar na vesícula e – por isso – não se fala. Se repararmos bem, dantes falava-se muito na pedra da vesícula. Hoje em dia, praticamente só se fala na pedra do rim (ou dos rins). Pelos vistos, ainda está na moda falar dos rins. Por quanto tempo…? Não sei.

Um amigo meu recomendou-me abandonar a ideia de me preocupar com a perda de estatuto social da vesícula biliar (sem bem que a palavra biliar lhe acrescenta algum brilho ao nome, não sei bem por quê) e dar atenção a outros órgãos supostamente mais engraçados, como o bolbo raquidiano, que ele diz que não consegue «tirar da cabeça». Sim… também era difícil, visto que o bolbo raquidiano é o ponto de passagem dos nervos que ligam a medula ao cérebro. Difícil é tirar uma coisa dessas da cabeça. Literalmente.

Não me parece que seja parte do corpo que venha a ser o super-fashion órgão do futuro. Não me parece nada. O próprio nome não encaixa bem numa conversa de elevador do tipo…

- Está de chuva, não está?
- É… E este tempo traz-me cá umas dores no bolbo raquidiano…!


Não soa bem.

A vesícula já era, temos de o admitir. Já não se fala dela. As “cruzes” também já tiveram o seu momento e… esse também já lá vai. Qual será o órgão sucessor nas bocas do mundo…? Confesso que é uma questão que – também ela – me intriga sobremaneira.

No Portugal das Revistas

Há muito que acredito que em Portugal existe uma espécie de “sub-País”. Com população própria, regras próprias (consequentemente, com auto-organização também) e, obviamente, uma própria sociedade sobre qual se fazem notícias… próprias.

A única diferença deste “sub-País” para o que resta de Portugal reside no facto de nada ter a ver com a nação portuguesa e com quem nela habita. Mais de resto… acho que está tudo nos conformes.

Chamemos a esse “sub-País”… digamos… Portugal das Revistas. É… Parece-me um nome adequado.

Tal como acredito na existência desse Portugal das Revistas, também creio que deve estar mais ou menos para o território nacional como o Lesoto está para a África do Sul; só que, neste caso, não está cartografado (e, por isso, não aparece em qualquer mapa), embora desconfie que se situa algures entre as zonas da Grande Lisboa e as Linhas de Sintra e Cascais.

Ora… nesse Portugal das Revistas a actual preocupação maior dá pelo nome de Mário Esteves. Há quem diga que se trata de um instrutor de surf. Pessoalmente – e até porque nunca pratiquei tal desporto – não faço puto de ideia quem seja. Simplesmente, penso ter lido algures (e ouvido falar) que se enrolou com uma outra pessoa, “residente” nesse Portugal das Revistas, chamada Elsa Raposo, por sinal muito famosa nesse “sub-País”. Ah… E que, tal como se enrolou, deixou de se enrolar e que agora queria enrolar-se com outra jovem promissora com imenso futuro nas colunas sociais, chamada Cinha Jardim.

Dizem os relatos que agora me chegam do Portugal das Revistas que Cinha Jardim aparentemente sofre de algo num rim, relacionado com uma bactéria mas que, mesmo no Hospital, conseguiu dar uma tampa de todo o tamanho ao pobre Mário Esteves que, logo depois de ter estado ocupado a fazer figura de urso, esticando a manta em vão (… coitado …), teve um acidente de automóvel, pelo que está – dizem as revistas – claramente descontrolado. E se as revistas dizem… a gente tem mesmo é de acreditar.

Estou em choque! Se soubesse onde fica exactamente esse Portugal das Revistas, ia lá só ver se dava uma forcinha ao moço. Ninguém merece passar por este tipo de coisas, pá! Se ao menos ele fosse alguma coisa de jeito na vida, sem ser só querer ser um tipo famoso… se calhar ainda se safava no mundo real. Agora… assim…! Só se pode ter pena do rapaz.

Mas ele nem sequer é o que está pior. Não, senhor! Pior estão aqueles habitantes do Portugal das Revistas cujas fotos nas páginas e páginas cheias de nada surgem acompanhadas de um número que remete para uma legenda onde se explica ao Povo quem é quem. Isso é genuinamente giro, acho eu. Giro e proveitoso… para eles. Só assim podem alguma vez pensar que no futuro chegarão – sabe-se lá… – a ter acidentes de carro e verem fotos suas surgirem desfocadas nas capas das publicações informativas do “sub-País”. Já agora… quanto mais desfocadas forem as fotos, maior é o estatuto de que goza quem nela surge… não é?...

Está encontrado o meu objectivo para os próximos tempos. Tentar descobrir onde fica esse tal de Portugal das Revistas e tentar percebê-lo, conhecendo os seus nativos e os hábitos deles. Só espero que não sejam perigosos. Ao ritmo que se comem uns aos outros, tenho de ter algum cuidado.

Serei cauteloso.

Jumping Monkeys & Yuppies Cantantes

Amiúde, somos confrontados com interessantíssimas manifestações de profissionalismo nesse mundo (que dizem ser maravilhoso) do atendimento ao público.

Esta manhã tive dois bons exemplos de que um pormenor pode não manchar irremediavelmente o brio profissional de quem quer que seja. Mas a imagem, meus amigos... essa… fica manchada de forma indelével na consideração do cliente, satisfeito com o serviço prestado, mas "algo" insatisfeito com o que viu.

Cada uma das histórias se conta rapidamente.

Saí de Lisboa em direcção a Setúbal, onde haveria de assinar contrato com a agência seguradora devido ao seguro do carro novo. Porto Salvo - Queluz - CREL (a caminho da Ponte Vasco da Gama, para fugir ao trânsito da outra) - IC17... portagem. Abro o vidro do carro ao mesmo tempo que se abre a pequena janela da cabine do portageiro. Lá, aparece uma cabeça que me diz «Bom Dia! São 50 cêntimos, por favor». Uma frase que só ouvi à segunda, confesso. Porquê? Porque logo que o portageiro abriu a janela a única coisa em que a minha atenção se fixou foi num tremendo "macaco" que desesperadamente queria saltar do nariz do zeloso funcionário da Brisa. Tenho ideia que o plano do "macaco" era a fuga para uma liberdade. Uma fuga que - julgo - não passaria de um simples (e parvo) pulo do nariz para o asfalto, para acabar por morrer estatelado no alcatrão e pisado por centenas de rodas nas horas seguintes. Fuga ainda não levada a cabo, claramente, à hora em que passei eu pela portagem. Depois disso, não sei o que se passou. Quanto ao serviço, nada a dizer... mas a imagem que me ficou foi mesmo a do "macaco (brevemente futuro) voador".

Já em Setúbal, para tratar do seguro... um típico yuppie (leia-se, um puto de vinte e poucos anos, provavelmente proprietário de uma malinha de executivo, enlatado num fato, atado com uma gravata e enfiado num escritório todos os dias das 9 às 5) atendeu-me solicitamente, é certo... mas (acho que se se aperceber) por duas ou três vezes começou a cantarolar as músicas que a pequena aparelhagem do escritório debitava. Não lhe afectou o discurso, não interrompeu a comunicação, não complicou o negócio, não teve qualquer consequência nefasta (o senhor até nem cantarolava mal)... mas não pareceu bem, tenho de o dizer.

É como ir num autocarro e o condutor (que conduz bem) se deitar a chamar nomes aos outros condutores. É como assistir a uma pequena discussão entre funcionários dos Correios enquanto somos atendidos por um deles. É como estar numa repartição de finanças e ver, lá ao fundo, um dos funcionários jogar Paciência no computador, quando há uma fila de gente à espera de ser atendida.

Nada disto afecta directamente o serviço de quem, efectivamente nos atende. Mas que fica mal... fica. E, muitas vezes, é essa imagem que fica.

Vamos Ensinar Português ao Povos!

Na sequência do InSenso anterior, ocorreu-me (é uma coisa que me acontece com alguma frequência... mas não dói, o que já não é mau de todo) que a questão do aperfeiçoamento da utilização da Língua Portuguesa pelos estrangeiros imigrados no nosso País pode (e acho mesmo que deve) depender não só do esforço deles mas também de um esforço nosso.

Esforço esse que seria assim tipo em jeito de retribuição por ter malta doutorada e quadros superiores na nossa construção civil, médicos em empregos de jardinagem e uma data de licenciadas como nossas empregadas domésticas. Nunca o nosso panorama laboral esteve tão bem apetrechado de rapaziada com belos canudos... em empregos de mero esforço físico. É obra.

Lembrei-me disto porque me lembrei de outra coisa (sim; a malta encadeia pensamentos e ideias com alguma facilidade, ainda que raramente de forma correcta e até responsável). Há uns anos valentes, um senhor tipicamente britânico aparecia bastantes vezes nos aparelhos de televisão do nosso País. Sorridente, dizia "Follow Me!" (frase que aparecia no ecrã) e pirava-se para dentro de uma estação de Metro (o repórter de imagem não o seguia; talvez a estação fosse mal frequentada ou algo do género).

Este era o mote para que, nos minutos seguintes, esse senhor e mais uns quantos (homens e mulheres), ensaiassem várias situações em que iam tentando - através de diálogos muuuuuuuuuito leeeeeeeeeentos e repetidos - ensinar Inglês aos povos. Com ou sem sucesso... não sei bem. Nunca vi aquilo com muita atenção e por essa altura já me ia safando; aprendia Inglês com os filmes e os episódios dos Três Duques na RTP.

Ainda assim, há que dar o mínimo de mérito a esta equipa de grandes profissionais britânicos. Um programa chato como aquele passar durante tanto tempo e com tantas repetições... não está ao alcance de todos. Isso também é obra.

Acho agora (e foi isso que me ocorreu) que deveríamos fazer um 'remake' do "Follow Me!", em Português. Chamar-se-ia, naturalmente, "Chega cá! Vem c'a gente!" e em diálogos longos e arrastados (talvez fosse boa ideia contactar desde já o Manoel de Oliveira para realizar o programa) a Língua Portuguesa seria ensinada aos imigrantes.

Só estou aqui com uma pequena dúvida. Sabendo que um estrangeiro aprende sempre as asneiras primeiro e o resto que realmente importa depois... não seria melhor despachar logo a parte do calão nos primeiros episódios para, lá mais para a frente, arrancar para programas mais sérios e, por fim, acabar em beleza, com um teste final lavrado e apresentado por esse vulto da televisão-bem-falada-portuguesa que é Edite Estrela?...

Façam Boa Viagem, FÁXÁVÔ!!!

O cartaz que o PNR colocou no Marquês de Pombal, basicamente, incitava os estrangeiros imigrantes em Portugal a "dar à sola", apanhando, se possível, um avião; sendo que, dessa forma, teriam a garantia de que seriam acarinhados pela malta do Partido Nacional Renovador com um simpático "Façam Boa Viagem!". Indo de carro, mota, autocarro, bicicleta, trike, qwad, barco ou até a pé... se calhar, já não.

É, sem dúvida, um acto de saber estar do PNR. Tudo o que se diga em contrário parece-me inadequado. Viajar de avião pode ser mais caro mas vai-se mais longe e mais rapidamente, com poucas paragens para abastecimentos mas, em compensação, com casas de banho no aparelho e algum espaço para "esticar as pernas" durante o voo. O PNR pode não querer cá a estrangeirada mas pensou no conforto de quem quer ver a milhas do nosso território.

Eu, pessoalmente, não colocaria um cartaz daqueles no Marquês de Pombal (nem noutro lado qualquer; se bem que o que eu acho que teria sido mesmo giro e pujante era o PNR ter feito esta campanha ali à entrada da Cova da Moura... ou mesmo DENTRO da Cova da Moura; teria tido outro impacto, convenhamos).

Não o faria, acima de tudo, porque não estou assim tão preocupado com a imigração em Portugal. Uma conclusão a que cheguei hoje mesmo (!), quando fui ao bar da empresa onde trabalho. Aliás, eu chego a uma data de conclusões quando vou ao bar da empresa. Sempre achei um local giro para chegar a conclusões. E chegar a conclusões, digamos, concludentes... é uma tarefa que deve ser realizada de barriga cheia ou, pelo menos, com um café tomado. É uma espécie de mínimo exigível para a coisa.

O bar está repleto de trabalhadoras brasileiras. Umas mais giras que outras. Umas mais solicitas que outras. Umas mais simpáticas que outras. Umas menos... ineficazes que outras (é... o bar está longe de funcionar bem... e é tudo caro que tolhe!). Mas avante.

De todas elas, há uma que se destaca pela rapidez com que despacha o último cliente para poder dizer ao seguinte, em voz bem alta, «FÁXÁVÔ!!!». Sim... assusta um bocadinho às primeiras vezes em que ela "berra" «FÁXÁVÔ!!!» lá de trás do balcão, directamente para os ouvidos da malta. Mas depois a dor de cabeça passa e o medo também. O que me parece relevante é que ela não diz - nem berra, para o caso - «FÁIS-FÁVÔ!!!», mas sim «FÁXÁVÔ!!!». Há uma clara diferença. A diferença entre a pronúncia puramente brasileira e o esforço em aprimorar uma aproximação à fonética de Camões. Esforço apreciável, diga-se.

Ora... espetar com essa imigrante brasileira num avião e desejar-lhe "Boa Viagem", sem esperar que ela volte um dia... parece-me um bocado mal. E tal como a ela, aos milhares de imigrantes de outras paragens. Os imigrantes do Leste Europeu - grande parte deles, pelo menos - chegam a falar Português até de forma mais correcta que muitos portugueses. Não estou a especular... é mesmo verdade. E se não falam bem a nossa língua, fazem um esforço por falar.

É certo que à empregada do bar falta ainda algum "caminho" até que o «FAZ FAVOR!!!» saia (ainda que em decibéis bem acima da média) mais próximo daquele que nós dizemos... Ou daquele que deveviamos dizer... É que, pensando bem... somos nós quem diz, por tudo e por nada, «Ó FÁXAVÔRE!!!». Eu, por exemplo, acho e defendo que só se deve pedir uma sandes de entremeada e uma cerveja Mini dessa maneira. De outra forma, não faz sentido. E acho salutar que a empregada do bar da empresa seja, por isso, já quase tão "portuguesa" quanto eu e mais "portuguesa" que muita malta que se diz lusitana.

Acredito que o PNR não pensou nisso quando colocou o cartaz no Marquês de Pombal.