A $olidão do Poder


Facto: Há gente com poder. Facto: Toda a gente sabe que há gente com poder. Facto: Nem toda a gente tem poder. Facto: Só há gente com poder porque há gente sem poder sobre quem a gente com poder tem autoridade. Facto: Quem não tem poder, de uma forma ou de outra, teme o poder de quem tem poder. Facto: O último facto é uma espécie de “Lei da Vida”.

Acho que tudo o que foi escrito até agora faz parte do conhecimento geral (vulgo, senso comum – um conceito mal amado aqui no burgo… vá lá saber-se porquê).

Talvez seja por todos estes factos que todos nós que temos chefes (e não somos chefes, naturalmente) fazemos por chegar sempre a horas aos nossos empregos, obedecemos às ordens que nos são dadas, não ofendemos os nossos superiores e cumprimos as regras ditadas por “quem de direito” (além disso, também é por essa razão que, por vezes, usamos a expressão “quem de direito” quando queremos, digamos, fugir com o rabo à seringa sem apontar na direcção do chefe se algo corre mal).

Ser chefe tem essa vantagem, portanto: ter poder. Há quem diga que se tem mais problemas, mais reuniões, mais conflitos, mais responsabilidade mas, por outro lado, ganha-se melhor e… tem-se poder. Só parece não se ter mais amigos com essa subida ao cargo.

Duas situações recentes fizeram-me ver isso, de forma mais ou menos clara.

1. Na sede de uma grande empresa nacional, uma reunião levou-me, primeiro, ao 11º piso do prédio onde o encontro com um executivo da companhia iria decorrer e, depois, de volta para o 1º andar, onde a sala marcada para o efeito estava de facto reservada para a reunião. Se a viagem para cima no elevador foi perfeitamente descontraída, a descendente, já com o executivo na nossa companhia, foi muito tensa e silenciosa. No elevador, cheio de gente, o silêncio foi desconfortável e confrangedor (o calor também, mas isso não vem ao caso). Foi o próprio executivo quem nos explicou a razão para o “som sepulcral” no ascensor: «Ia lá um administrador…». Presumo que, se toda a gente naquela empresa (e trabalha lá muita gente) se comportar assim, o senhor administrador (que deve ter muito poder) não ouve vivalma um dia inteiro.

2. Numa loja de materiais de construção e bricolage, uma ida ao balcão de informações em busca de um produto que em tempos lá tinha adquirido e que agora não encontrava resultou na chamada, primeiro, de dois funcionários que não resolveram a minha questão e, por fim, na chegada daquele que na minha mente apelidei de “Chefe da Secção de Pequenos Instrumentos e Quinquilharia”. Ponto prévio: não vejo como chegar a “Chefe da Secção de Pequenos Instrumentos e Quinquilharia” possa não ser um verdadeiro pico na carreira de quem trabalhe numa loja de bricolage. Acho que o jovem (25 anos, no máximo) que me atendeu pensava exactamente assim quando, com a sua imagem franzina, voz fininha e óculos geek, deu um par de ordens aos seus subalternos de secção. Ordens que ambos… não cumpriram (pelo menos, não de imediato), continuando a fazer aquilo que tinham em mãos, não passando grande cartão ao superior, mesmo sem o afrontar.

Em ambos os casos, percebi que os chefes – mesmo que em diferentes pontos das suas cadeias hierárquicas – não gozavam da simpatia dos seus súbditos. Pode ser um pormenor, tê-la ou não a ter, quando o importante de ser chefe é ter o poder e exercê-lo sobre os outros. Afinal,… ganha-se mais, não ganha?... mas tenho dúvidas se esse x a mais na conta do banco compensa a solidão que parece vir, automaticamente, com o cargo (assim como as batatas fritas vêm sempre com o “Bife à Casa”).

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